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Multiverso D6

Quando eu escrevi o CRÔNICAS DO MULTIVERSO eu queria um RPG simples, para não dizer rudimentar, e que fosse aquilo que chamamos de “RPG Tradicional”, com a velha estrutura “Mestre-Jogadores-PJs”. Ao mesmo tempo, eu gostaria de homenagear algum jogo consagrado e, talvez, oferecer algo em português brasileiro que tivesse um peso para os fãs do jogo homenageado.

Para isso eu recorri ao passado e um pouco de nostalgia. As opções de licenciamento ajudaram a reduzir a lista de candidatos. O Action! e o Open Core poderiam trazer o espírito do Fuzion e do HERO System. O d20 system como um todo (em sua versão Modern e Space) poderiam me dar uma base boa para homenagear o GURPS, por exemplo. Só que estes jogos embora tivessem um grande apelo emocional para mim por terem sido importantes na minha vida como jogador de RPG pecavam pelo excesso e a proposta do “simples e rudimentar” não se sustentaria. Isso sem falar no tempo necessário que eu teria que me dedicar para produzir algo.

No fim, me apeguei a um sistema bem mais simples e cinematográfico que, na época em que foi lançado, tentou nadar contra a maré dos jogos simulacionistas ao apresentar um sistema que possuia uma abstração mais simples para acomodar os cenários que buscou representar.

O sistema D6 alimentou jogos da West End Games como Ghostbusters e Men in Black mas foi com o Star Wars que ele ganhou verdadeira notoriedade no mercado norte-americano, demonstrando que um jogo não precisa ser complexo nem superdetalhado para ser interessante – basta ter uma identidade forte, um cenário jogável e uma proposta de jogo clara. Star Wars de 1987 tinha todas estas características e foi um marco nos RPGs.

É preciso entender uma coisa: naquela época os RPGs prezavam por um simulacionismo extremo: coisas como assinalar pontos de vida para partes diferentes do corpo, ou subsistemas para simular armas emperradas, tiros ricochete, lutar em cavalos assustados e até mesmo cavar buracos. Star Wars, especialmente em sua primeira edição, se apresentava com algo muito mais simples e uma granularidade bem baixa para os padrões da época. Ele foi aceito porque essas premissas casavam muito bem com o cenário e o estilo heróico/aventuresco da Trilogia Original. Para os padrões de hoje, Star Wars 1E possui muitas características dos jogos que vemos por aí, mas naquela época aquilo era diferente e ia contra tudo que os grognards que impregnavam o hobby esperavam de um RPG de ficção científica. Podemos dizer que a WEG criou algo ligeiramente à frente do seu tempo e o jogo, enquanto produto, se tornaria a tendência de muitos jogos atuais.

Como foi isso, na prática? Bem, vamos dar uma olhada na ficha de personagem da primeira edição – mais especificamente, vamos olhar uma página que apresenta os famosos Templates de Personagens Jogadores:

E é isso, somente isso. De verdade. A ficha ocupava 1/3 de página. Criar um trapaceiro em SWD6 leva em torno de cinco minutos e sua mecânica unificada permitia que uma campanha inteira acontecesse com estas míseras informações.

Ótimo, então eu tinha um sistema escolhido ideal para o meu “RPG Tradicional + Simples+ Rudimentar”. Melhor ainda é que o sistema OpenD6 (a versão aberta do sistema D6) possuia uma versão que remetia a esse espírito simples do Star Wars primeira edição e que era pequeno o bastante para que eu desse conta de trabalhar em sua tradução por conta própria: o MiniSix.

Lendo o seu livro de regras, o aspecto que mais chama a atenção sobre MiniSix é sua apresentação enxuta. Nada ali é inútil e, apesar de pecar um pouco na apresentação da dinâmica de jogo e a carência de alguns exemplos, ele te entrega um sistema completo mas ágil e compacto, com o benefício de oficializar muitas regras caseiras que os veteranos do sistema D6 sempre usaram para tornar o jogo mais rápido e com menos rolagens de dados.

Foi a partir dele que CRÔNICAS DO MULTIVERSO (antes chamado de MODULA 6 RPG) foi criado, a única real alteração é que seu material foi combinado com outras referências publicadas sob a OGL para criar as “Opções Extras” de personagem, como Magia, Psiquismo e Super Poderes.

Depois de algumas iterações e mudanças de nome, eu terminei com o CRÔNICAS DO MULTIVERSO: MÓDULO BÁSICO que você pode conferir na página do jogo, disponível para download. Eu busquei acrescentar as coisas que considero fundamental ao corpo de regras do MiniSix e, como se já não fosse o bastante, eu acabei por simplificar ainda mais a lista de perícias e esta foi a mudança mais profunda que fiz no núcleo do jogo. Elas são propositalmente abrangentes, sendo que delas funcionam como uma extensão dos atributos para especificar um dos muitos aspectos que um atributo pode representar: Força é dividida em Luta, Atletismo e Vigor, enquanto que a Inteligência possui coisas como Conhecimento e Percepção.

Mesmo com essa abstração mais simples das Perícias, você ainda é capaz de adaptar boa parte do material D6 para o CRÔNICAS DO MULTIVERSO. Ao longo dos testes, o catálogo de poderes apresentado no capítulo “Extras” provou ser bem versátil prevendo como a maioria dos efeitos provenientes de Poderes Extraordinários funciona. Ao mesmo tempo, a simplicidade em sua execução torna claro sobre como novos efeitos podem ser agregados. Seu cenário lida com o conceito de Ressurreição? Ótimo! Faça dele uma Ampliação do poder Cura. Simples assim.

Com as regras prontas, vieram os cenários. Até o momento, Crônicas do Multiverso possui três suplementos: Reino de Sombra & Névoa, Planeta Esquecido e Nova Néride. Todos eles possuem também uma abordagem prática e enxuta, se concentrando em prover conteúdo jogável para Árbitro e Jogadores iniciarem suas aventuras e campanhas. Muitos colecionadores provavelmente vão achar esse conteúdo pouco ou simplório demais mas a essa crítica eu respondo: se nós, Árbitros, podemos comport e conduzir uma aventura com anotações simples, poucas listas e um pouco de criatividade então porque um cenário não pode ser apresentado dessa forma? Porque os RPGs dizem que com muito pouco se pode iniciar um jogo mas, logo em seguida, apresentam o cenário na casa das centenas de páginas? Os cenários seguem um formato que se aproxima mais das notas do Árbitro e daquilo que realmente importa para manter as coisas em movimento.

E esse é o resumo do que Crônicas do Multiverso significa: um sistema simples e cenários que servem tanto como mateiral para um noite de jogatina como uma referência inicial para campanhas longas. Particularmente tive ótimas aventuras e uma campanha muito bem sucedida usando esse jogo e eu vejo o DNA dos jogos mencionados aqui com grande carinho.